Poema VIII, Canto Sétimo


Poema de Jorge de Lima



Vela rôta final na travessia
refletida na última comporta
estacando-se nesse alegre dia.
Imensa solidão. Cerrada porta.

E agora? Agora vês o que não vias:
tua imobilidade recomposta
no primitivo barro em que jazias,
com esse manto de treva em tuas costas.

E essa mosca vagando em tua testa!
E essa corrupção em tua entranha!
De tão murchos teus lábios rir parecem.

Outras coisas curiosas acontecem:
teu cadáver metido nesse estranho
traje a rigor de bailes e de festas.




Fonte: "Invenção de Orfeu", Tecnoprint Gráfica, 1967.
Originalmente publicado em: "Invenção de Orfeu", Livros de Portugal S. A, 1952.