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Doçura de estar só quando a alma torce as mãos!
- Oh! doçura que tu, silêncio, unicamente
sabes dar a quem sonha e sofre em ser o Ausente,
ao lento perpassar destes instantes vãos!
Doçura de estar só quando alguém pensa em nós!
De amor e de evocar, pelo esplendor secreto
e pálido de uma hora em que ao seu lábio inquieto
floresce, como um lírio estranho, a Sua voz!
Doçura de estar só quando finda o festim!
(E a saudade, acordando as vozes que calaram!
E os candelabros que, olvidados, se apagaram!
E os lustres de cristal! E as teclas de marfim!)
Doçura de estar só, calado e sem ninguém!
Dolência de um murmúrio em flor que a sombra exala,
sob o fulgor da noite aureolada de opala
que uma urna de astros de ouro ao seio azul sustém!
Doçura de estar só! Silêncio e solidão!
Ó fantasma que vens do sonho e do abandono,
dá-me que eu durma ao pé de ti do mesmo sono!
Fecha entre as tuas mãos as minhas mãos de irmão!
Fonte: "A divina quimera", digitalização de Marco Antonio Rodrigues ,2006.
Originalmente publicado em: "A divina quimera", Tipografia Apollo Vieira da Cunha & Cia, 1916.