Temor


Poema de Raimundo Correa



        Esses momentos breves
De ventura, e em que um raio doce aclara
Um trecho à tua tenebrosa vida,
        Saboreá-los deves;
Esses momentos de fugaz ventura.
- Esta é como esquisita fruta rara,
Por muito rara, muito apetecida;
Fruta, cujo sainete pouco dura,
Saboreada com vagar, embora;
Deleita o gosto, assim saboreada,
Porém, sofregamente devorada,
Machuca e sangra a boca que a devora.
        Que esse lábio sorria
Enquanto a dor sopita não desperta,
Nem vem do íntimo gozo, que ele cala
        Discreto e silencioso,
Nenhum rumor alegre despertá-la.
Como um vinho acre-doce, da alegria
Ao saibo às vezes mescla-se o amargoso
        De uma tristeza incerta
E vaga... Aos tristes disfarçá-la custa;
Pois, por um só prazer, mesquinho e raro,
A desventura cobra-se tão caro,
Que aos tristes o menor prazer assusta !



Fonte: "Versos e versões", Moreira Maximino & Cia, 1887.
Originalmente publicado em: "Versos e versões", Moreira Maximino & Cia, 1887.


Tecnologia do Blogger.