O chamado das pedras

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Poema de Cora Coralina



A estrada está deserta.
Vou caminhando sozinha.
Ninguém me espera no caminho.
Ninguém acende a luz.
A velha candeia de azeite
de a muito se apagou.

Tudo deserto.
A longa caminhada.
A longa noite escura.
Ninguém me estende a mão.
E as mãos atiram pedras.

Sozinha...
Errada a estrada.
No frio, no escuro, no abandono.
Tateio em volta e procuro a luz.
Meus olhos estão fechados.
Meus olhos estão cegos.
Vêm do passado.

Num bramido de dor.
Num espasmo de agonia
ouço um vagido de criança.
É meu filho que acaba de nascer.

Sozinha...
Na estrada deserta,
sempre a procurar
o perdido tempo
que ficou pra trás.

Do perdido tempo.
Do passado tempo
escuto a voz das pedras:

Volta... Volta... Volta...
E os morros abriam para mim
imensos braços vegetais.

E os sinos das igrejas
que ouvia na distância
Diziam: Vem... Vem... Vem...

E as rolinhas fogo-pagou
das velhas cumeeiras:
Porque não voltou...
Porque não voltou...
E a água do rio que corria
chamava... chamava...

Vestida de cabelos brancos
Voltei sozinha à velha casa, deserta.



Fonte: "Meu livro de cordel", Global Editora, 2012.
Originalmente publicado em: "Meu livro de cordel", Editora Cultura Goiana, 1976.

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