Desdéns seguem como sombras
Poema de Gregório de Matos
Cada dia vos cresce a formosura,
Babu, e tanto cresce que me embaça.
Se cresce contra mim, alta desgraça,
Se cresce para mim, alta ventura.
Se cresce por chegar-me à mor loucura,
Para seres mais dura e mais escassa,
Tal rosto se não mude, antes se faça
Mais firme do que a minha desventura.
De que pode servir seres mais bela,
Ver-vos mais soberana, e desdenhosa?
Dai ao demo a beleza que atropela.
Bendita seja a feia e a ranhosa
Que roga, que suspira e se desvela
Por dar-se toda a troco de uma prosa.
Fonte: "Obra Poética", Editora Record, 1992.
Originalmente publicado em códices da segunda metade do século XVII.