O índio invisível - Murilo Mendes


Poema de Murilo Mendes



O índio fica no escuro,
O índio não sai do escuro
Mas o inimigo ele vê.

Tem o inimigo um sentido,
Tem o sentido do tato,
Só sabe as armas pegar.

Camarão tem todos eles
Bem aguçados, treinados;
Ninguém tem um faro assim.

O inimigo se aproxima,
Não vê ninguém na sua frente,
Nem de lado, nem atrás.

De repente um tiro canta,
Ou então seta certeira,
Cai o inimigo no chão.

Os inimigos arriscam:
Aqui tem mas é macumba,
Aqui tem assombração.

Mal acabam de falar,
Parte outra seta do escuro,
Ninguém sabe de onde vem.

Fica tudo desnorteado,
Não sabe pra onde atiram,
Acabam então dando o fora.

Camarão sumiu no escuro.
Ninguém o pega, não vê.
Sumiu debaixo da terra.

Depois Camarão morreu,
Desaparece no escuro,
Mas já está acostumado.

Sumiu, sumiu para sempre,
Ninguém viu ele morrer.




Fonte: "Poesia completa e prosa", Nova Aguilar, 1994.
Originalmente publicado em: "História do Brasil", Edição de Ariel, 1932.