1913, ou a corrente de ar - Murilo Mendes

Murilo Mendes - poeta de segunda geração do modernismo brasileiro

Poema de Murilo Mendes



Lembro-me às vezes com amor
Daqueles dias fagueiros
Onde a gente deslizava,
Sem receio, no universo:
Eu respirava bom ar,
Nos dias de grande festa
Trajava uma roupa inglesa
De veludo, minhas primas
Assobiavam a "Caraboo",
Tocavam "La Valse Bleue";

Dulce, a filha do vizinho,
Ia comigo ao colégio,
Pelo que não se aprendia
Nem geometria, nem história.
Meus parentes me cuidavam,
Faziam recomendações:
"Ande sempre penteadinho,
Evite as correntes de ar!"




Fonte: "Poesia completa e prosa", Nova Aguilar, 1994.
Originalmente publicado em: "O visionário", José Olympio Editora, 1941.