Noturno (caderno H)
Poema de Mario Quintana
Quando as pessoas adormecem é que as coisas acordam, no silêncio da paz recuperada.
O relógio de parede pode agora tricotar descansadamente os seus segundos, sem que ninguém venha meter o nariz no seu trabalho, ora achando-o muito rápido, ora arrastado demais.
Enquanto, na mesmíssima página do Dicionário Biográfico, lá na estante do escritório, os retratos de Napoleão e de Nabucodonosor olham-se atravessado, com grande indignação do Imperador, visto que o outro ignora tudo, mas tudo mesmo, a seu respeito...
Isto porque essa gente arquivada só lê o próprio verbete.
Fonte: "Poesia Completa", Editora Nova Aguilar, 2006.
Originalmente publicado em: "Caderno H", 1973.