A distribuição do tempo

Imagem de Carlos Drummond de Andrade

Poema de Carlos Drummond de Andrade



Um minuto, um minuto de esperança,
e depois tudo acaba. E toda crença
em ossos já se esvai. Só resta a mansa
decisão entre morte e indiferença.

Um minuto, não mais, que o tempo cansa,
e sofisma de amor não há que vença
este espinho, esta agulha, fina lança
a nos escavacar na praia imensa.

Mais um minuto só, e chega tarde.
Mais um pouco de ti, que não te dobras,
e que eu me empurre a mim, que sou covarde.

Um minuto, e acabou. Relógio solto,
indistinta visão em céu revolto,
um minuto me baste, e a minhas obras.



Fonte: "Poesia completa", Editora Nova Aguilar, 2006.
Originalmente publicado em: "Fazendeiro do ar", 1954.

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