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Poema de Francisca Júlia



Quando, curva a cabeça, à toa, o passo tardo
                    por ruas desertas caminho,
à hora crepuscular em que, sob o céu pardo,
asas se cruzam no ar em demanda do ninho,

e o céu é triste, o ambiente é leve, e as auras puras
deixam, suspensas no ar, a amargura das notas,
vêm-me recordações de existências obscuras
que no sepulcro estão das épocas remotas.

Na Índia vejo-me a ler, sóbrio o gesto e voz clara,
à multidão que escuta o sábio Verbo e o Exemplo,
preces do Bagavatta e do Vedanta-Sara,
sob os negros umbrais de um arruinado templo.

Fui chela, fui faquir, fui shaberon; e inda hoje
minha imaginação, no seu voo altaneiro,
                    desprende-se, ala-se e foge
para aquelas regiões onde nasci primeiro.



Fonte: "Poesia reunida de Francisca Júlia", escamandro, 2015.
Originalmente publicado em: "Esfinges", Typographia do Diario Official, 1899.

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