As facas Pernambucanas
Poema de João Cabral de Melo Neto
O Brasil, qualquer Brasil,
quando fala no Nordeste,
fala da peixeira, chave
de sua sede e de sua febre.
Mas não só praia é o Nordeste,
ou o Litoral da peixeira:
também é o Sertão, o Agreste
sem rios, sem peixes, pesca.
No Agreste, e Sertão, a faca
não é a peixeira: lá,
se ignora até a carne peixe,
doce e sensual de cortar.
Não dá peixes que a peixeira,
docemente corte em postas:
cavalas, perna-de-moça,
carapebas, serras, ciobas.
Lá no Agreste e no Sertão
é outra a faca que se usa:
é menos que de cortar,
é uma faca que perfura.
O couro, a carne-de-sol,
não falam a língua de cais:
de cegar qualquer peixeira
a sola em couro é capaz.
Esse punhal do Pajeú,
faca-de-ponta só ponta,
nada possui de peixeira:
ela é esguia e lacônica.
Se a peixeira corta e conta,
o punhal do Pajeú, reto,
quase mais bala que faca,
fala em objeto direto.
Fonte: "A educação pela pedra e depois", Editora Nova Fronteira, 1997.
Originalmente publicado em: "A escola das facas", 1980.
Fonte: "A educação pela pedra e depois", Editora Nova Fronteira, 1997.
Originalmente publicado em: "A escola das facas", 1980.