Litoral de Pernambuco
Poema de João Cabral de Melo Neto
O mar se estende pela terra
em ondas ondas que se revezam
e se vão desdobrando até
ondas secas de outras marés:
as da areia, que mais adiante
se vão desdobrando nos mangues,
que se desdobram (quase palha)
num capim lucas, de limalha,
que se desdobra em canaviais,
desdobrados sempre em outros mais,
e desdobrando ainda mais longe
o campo raso do horizonte,
como se tudo fosse o mar
em mais ondas a desdobrar
a mesma natureza rente
de um verde ácido e higiene:
tudo debaixo do alumínio
de um sol de cima e nordestino,
sem que nada, ou coisa, interponha
o domingo de alguma sombra,
tudo sob um céu mineral
que preside em pedra, imparcial,
e que devassa tudo ali:
mesmo os grotões onde parir.
Originalmente publicado em: "Quaderna", 1960.