Voz fugitiva
Poema de Cruz e Souza
Às vezes, na tua alma que adormece
Tanto e tão fundo, alguma voz escuto
De timbre emocional, claro, impoluto
Que uma voz bem amiga me parece.
E fico mudo a ouvi-la, como a prece
De um meigo coração que está de luto
E livre, já, de todo o mal corrupto,
Mesmo as afrontas mais cruéis esquece.
Mas outras vezes, sempre em vão procuro
Dessa voz singular o timbre puro,
As essências do céu maravilhosas.
Procuro ansioso, inquieto, alvoroçado,
Mas tudo na tua alma está calado
No silêncio fatal das nebulosas.
Fonte: "Últimos sonetos", Aillaud & Cia , 1905.
Originalmente publicado em: "Últimos sonetos", Aillaud & Cia , 1905.