Fraqueza

Imagem Henriqueta Lisboa

Poema de Henriqueta Lisboa



É estranho. Cada vez que resolvo acabar,
acontece uma coisa, uma coisa qualquer
que me desarma o gesto e me abranda o olhar.
Às vezes, nem sei que... minúcias de mulher...

Uma expressão de mágoa, um ritmo mais profundo
na entonação da voz, uma palavra à toa
- dessas que a gente diz diante de todo mundo
para os ouvidos de uma só pessoa.

Menos que isto, sei lá! Basta a recordação
de algum olhar mais demorado e lindo,
a lembrança feliz de um aperto de mão
que um dia nos surpreende e nos deixa sorrindo...

O abandono do eu-mesmo, a vontade doentia
de esquecer por alguém toda a nossa vontade,
de ficar sem saber se é ou não fantasia,
de ver alguém mentir quando a voz nos persuade...

Esta vida mais ampla, este sossego suave
de ter em quem pensar pelas tardes chuvosas,
de guardar na retina um simples voo de ave
e de sentir melhor o perfume das rosas...

Este sonho de outrora, esta poesia antiga
que guarda o que é fugaz como um vidro de extrato...
O gosto de esperar a mesma letra amiga,
de esconder entre as mãos sempre o mesmo retrato...

Depois... adiar é bom... se por mal ou por bem,
tudo na vida acaba em lágrimas ou brinquedo,
e a nossa história há de acabar também,
antes mais tarde, meu amor, do que mais cedo...



Fonte: "Enternecimento", Paulo Pongetti Editora, 1929.
Originalmente publicado em: "Enternecimento", Paulo Pongetti Editora, 1929.

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