Flores de Ouro Preto - Murilo Mendes
Poema de Murilo Mendes
Vi a cidade barroca
Sem enfeites se levantar.
Nem flores eu pude ver,
Flores da vida fecunda,
Nesta áspera Ouro Preto,
Nesta árida Ouro Preto:
Nem veras flores eu vi
Nascidas da natureza,
Da natureza lavada
Pelo frio e o céu azul.
Tristes flores de Ouro Preto!
Só vi cravos-de-defunto,
Apagadas escabiosas,
Murchas perpétuas sem cheiro,
Só vi flores desbotadas
Nascidas de sete meses,
Só vi cravos-de-defunto
Que se atam ao crucifixo,
Que se levam ao Senhor Morto.
Vi flores de pedra azul...
Eu vi nos muros de canga
A simples folhagem rasa,
A avenca úmida e humilde,
Brancos botões pequeninos
A custo se entreabrindo,
Mas não vi flores fecundas,
Não vi as flores da vida
Nascidas à luz do sol.
Eu vi a cidade árida,
Estéril, sem ouro, esquálida;
Eu vi a cidade nobre
Na sua patina fosca,
Desfolhando lá das grimpas
No seu regaço de pedra
Buques de flores extintas.
Eu vi cidade sóbria
Medida na eternidade,
Severa se confrontando
À cinza das ampulhetas,
Sem outro ornato apurado
Além da pedra do chão.
Eu vi a cidade barroca
Vivendo da luz, do céu.
Fonte: "Poesia completa e prosa", Nova Aguilar, 1994.
Originalmente publicado em: "Contemplação de Ouro Preto", Ministério da Educação e Cultura, 1954.
Fonte: "Poesia completa e prosa", Nova Aguilar, 1994.
Originalmente publicado em: "Contemplação de Ouro Preto", Ministério da Educação e Cultura, 1954.
