Avesso
Poema de Olga Savary
E torna a acontecer em nós um tempo não havido,
o muito-e-pouco amor que não tivemos,
paixão que nos abocanhou de assalto
como serpente alerta para o bote.
Tantas coisas pensadas, o ensaio de dizê-las,
a tentativa de dizer o que não foi dito.
A dor da vida que por ser vivida
é também prazer e é delícia,
eu amor se amolda nessa falsa paz
de pedras onde firo e sou ferida.
Força é lamber o sangue derramado
nessas mesmas pedras, falso rio,
em que visceralmente
- melhor: uteralmente -
domo, sou domada.
Fonte: "Repertório selvagem - obra reunida", Biblioteca Nacional/ Multi Mais/ Universidade de Mogi das Cruzes, 1998.
Originalmente publicado em: "Magma", Massao Ohno/Roswitha Kempf Editores, 1986.