Inexorável

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Poema de Cruz e Souza



Ó meu Amor, que já morreste,
Ó meu Amor, que morta estás!
Lá nessa cova a que desceste,
Ó meu Amor, que já morreste,
Ah! nunca mais florescerás?!

Ao teu esquálido esqueleto
Que tinha outrora de uma flor
A graça e o encanto do amuleto;
Ao teu esquálido esqueleto
Não voltará novo esplendor?!

E ah! o teu crânio sem cabelos,
Sinistro, seco, estéril, nu...
(Belas madeixas dos meus zelos!)
E ah! o teu crânio sem cabelos
Há de ficar como estás tu?!

O teu nariz de asa redonda,
De linhas límpidas, sutis,
Oh! há de ser na lama hedionda
O teu nariz de asa redonda
Comido pelos vermes vis?!

Os teus dois olhos - dois encantos -
De tudo, enfim, maravilhar,
Sacrário augusto dos teus prantos,
Os teus dois olhos - dois encantos -
Em dois buracos vão ficar?!

A tua boca perfumosa,
O céu do néctar sensual
Tão casta, fresca e luminosa,
A tua boca perfumosa
Vai ter o cancro sepulcral?!

As tuas mãos de nívea seda,
De veias cândidas e azuis,
Vão se extinguir na noite treda
As tuas mãos de nívea seda,
Lá nesses lúgubres pauis?!

As tuas tentadoras pomas
Cheias de um magnífico elixir
De quentes, cálidos aromas,
As tuas tentadoras pomas
Ah! nunca mais hão de florir?!

A essência virgem da beleza,
O gesto, o andar, o sol da voz
Que iluminava de pureza,
A essência virgem da beleza,
Tudo acabou no horror atroz?!

Na funda treva dessa cova,
Na inexorável podridão
Já te apagaste, estrela nova,
Na funda treva dessa cova,
Na negra transfiguração!



Fonte: "Faróis", Laemmert & Cia Livraria, 1900.
Originalmente publicado em: "Faróis", Laemmert & Cia Livraria, 1900.

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