Poema transitório
Eu que nasci na Era da Fumaça - trenzinho
vagaroso com vagarosas
paradas
em cada estaçãozinha pobre
para comprar
pastéis
pés-de-moleque
sonhos
- principalmente sonhos!
porque as moças da cidade vinham olhar o trem passar
elas suspirando maravilhosas viagens
e a gente com um desejo súbito de ali ficar morando
para sempre... Nisto,
o apito da locomotiva
e o trem se afastando
e o trem arquejando
é preciso partir
é preciso chegar
é preciso partir é preciso chegar... Ah, como a vida é urgente!
...no entanto
eu gostava era mesmo de partir...
e - até hoje - quando acaso embarco
para alguma parte
acomodo-me no meu lugar
fecho os olhos e sonho:
viajar, viajar
mas para parte nenhuma...
viajar indefinidamente...
como uma nave espacial perdida entre as estrelas.
Fonte: "Quintana de Bolso", Editora L&PM Pocket, 2007.
Originalmente publicado em: "Baú de Espantos", 1986.